2023-06-13 | CONCEPÇÃO-CONSTRUÇÃO DA RESIDÊNCIA ACADÉMICA DE VALENÇA
COMUNICADO
CONCEPÇÃO-CONSTRUÇÃO DA RESIDÊNCIA ACADÉMICA DE VALENÇA
Promovido pela Câmara Municipal de Valença
Na sequência da tomada de conhecimento do Concurso de «Conceção-Construção da Residência Académica de Valença», publicado em D.R. n.º 101, de 25 de maio de 2023, e da análise sumária às peças do procedimento, disponíveis em https://www.vortalgov.pt, o serviço da Encomenda do Conselho Diretivo Regional do Norte (CDRN) da Ordem dos Arquitectos (OA) concluiu que o procedimento foi lançado ao abrigo do art.º 2.º-A da Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, que aprova as Medidas Especiais de Contratação Pública, ou seja, à luz do «Regime Especial de empreitadas de conceção-construção».
Antes de mais, há que ter em conta que a OA, não sendo «contra o regime de Conceção-Construção, considerando-o um regime válido e perfeitamente balizado no atual Código de Contratos Públicos ...» enquanto «... um regime excecional, para casos devidamente fundamentados, onde a complexidade da obra impõe uma ligação do executante à sua conceção,» conforme consagrado no n.º 3 do art.º 43.º do CCP, não pode concordar com a transformação de um regime excecional num regime de regra, pois que entende que o regime de conceção-construção consagrado no art.º 2.º-A da Lei n.º 30/ 2021, de 21 de maio, resultará num generalizado decréscimo da qualidade da obra construída, com graves implicações para o território e para a paisagem edificada, bem como para o exercício da profissão de arquiteto, estando em causa questões da relevância maior para a salvaguarda da Arquitetura e do interesse público subjacente.
Ora, apesar do Regime Especial de empreitadas de conceção-construção se encontrar atualmente consagrado na Lei portuguesa, o CDRN entende que o tipo de procedimento adotado pela entidade adjudicante não terá sido a melhor opção para o objeto em questão, levantando uma série de questões técnicas e jurídicas, que terão certamente implicações na qualidade da obra construída.
Feito o enquadramento necessário, o CDRN, no âmbito das suas atribuições definidas no Estatuto da Ordem dos Arquitectos - Decreto-Lei 176/98, de 3 de Julho, alterado pela Lei n.º 113/2015, de 28 de Agosto - e numa análise estritamente sumária ao procedimento em concreto, enviou um ofício à Entidade Adjudicante, ao qual aguarda resposta, manifestando as suas reservas relativamente a algumas opções tomadas.
- Estudo Prévio
No presente procedimento é disponibilizado um projeto de arquitetura da Residência Académica que, segundo as peças concursais, se encontra desenvolvido ao nível da fase de Estudo Prévio, conforme o exigido no n.º 2 do art.º 2.º-A da Lei n.º 30/2021 de 21 de maio.
Ora, sendo o Estudo prévio, de acordo com a alínea j) da portaria 701-H/2008, «o documento elaborado pelo Projectista, depois da aprovação do programa base, visando a opção pela solução que melhor se ajuste ao programa, essencialmente no que respeita à concepção geral da obra», é suposto que os elementos apresentados pela entidade adjudicante a concurso, e que constituem o Estudo Prévio exigido na lei, sejam uma base consistente do procedimento, a solução que melhor retrate os reais objetivos do programa que se quer ver concretizado, ainda que seja permitido introduzir meros ajustes.
Contudo, analisado o documento «Especificações técnicas», particularmente o que é afirmado na subalínea b), alinea ii), questiona-se a verdadeira intenção da entidade adjudicante ao apresentar um Estudo Prévio, se não é uma mera necessidade de dar cumprimento aos pressupostos exigidos na lei, que lhe permite optar por um procedimento em Regime Especial de empreitadas de conceção-construção. Esta convicção fundamenta-se, desde logo, na abertura, sem limites, dada aos concorrentes para «... alterar as caraterísticas da residência académica face ao estudo prévio ...» de forma substancial e não meramente pontual, pois que permitem alterar a «área de implantação com o limite de 50% ... área de construção ... número de pisos ... tipologias de quartos ... programa de espaços ... carateristicas dos espaços», alterações aquelas que poderão consubstanciar num projeto completamente diferente do inicialmente apresentado.
- Documentos da proposta
Segundo o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 78/2022, de 7 de novembro, «Neste quadro de criação de medidas de aceleração e simplificação procedimental, entende-se como especialmente destacável a criação, ..., de um novo regime de conceção-construção especial, ..., que possibilite a eliminação de dispêndios de tempo e recursos desnecessários, por parte da entidade adjudicante, ...».
Ora, analisado este que é, em forma e conteúdo, um caso prático deste novo tipo de procedimento, o CDRN constata que o governo, com a tão prometida agilização e simplificação dos procedimentos para as entidades adjudicantes, se esqueceu dos mesmos requisitos para os operadores económicos, imputando àqueles um esforço imensurável de tempo, recursos humanos e financeiros que não serão reembolsados.
Isto porque, na fase de concurso, é exigido, a todos os concorrentes, um conjunto excessivo de elementos, como sejam o Projeto de arquitetura e das várias especialidades, ao nível do Anteprojeto, bem como o desenvolvimento de outros estudos e planos, que acarretarão para as entidades concorrentes um trabalho efetivo (tempo e recursos materiais e humanos) e que, de acordo com o artigo 12.º da Portaria n.º 701-H/2008 representa, em condições normais, 50% do custo do projeto, que apenas será consequente e objeto de algum retorno economico-financeiro no caso do adjudicatário. Ou seja, todo o mercado de concorrentes estará a fazer um investimento efetivo que será totalmente inconsequente, não havendo interesse público que legitime essa desproporção de esforços e benefícios. Afigura-se, pois, que esta modalidade de procedimento pré-contratual fere no seu âmago o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 7.º do Código do Procedimento Administrativo e no n.º 1 do artigo 1.º-A do Código dos Contratos Públicos.
- Critérios de adjudicação
Nesta nova modalidade, as propostas dos concorrentes, nas suas duas vertentes - projeto e empreitada -, serão avaliadas pela modalidade multifator, devendo obrigatoriamente «os fatores e eventuais subfactores que o densificam ser estritamente objetivos, garantir uma adequada comparabilidade das propostas e incluir, pelo menos, o preço relativo à conceção e o preço relativo à execução da obra».
Cumpre clarificar que, nesta nova modalidade, não há qualquer avaliação da solução conceptual na fase de concurso, pois que estarão sob avaliação duas aquisições de serviços, a de aquisição de serviços para elaboração de projeto e a de empreitada em si. A avaliação de solução conceptual implicaria ter um conjunto de fatores e eventuais subfatores subjetivos, o que não é permitido por lei.
Contudo, e contrariando o estipulado no n.º 5 do art.º 2.º-A do regime especial, foram definidos critérios subjetivos de avaliação conceptual, como sejam o caso dos fatores «Valia técnica da conceção» e «Sustentabilidade e Inovação». Está, pois, o procedimento ferido de nova fragilidade inultrapassável.
- Direitos de Autor
Para que esta nova modalidade seja exequível, terão as entidades adjudicantes que acautelar o respeito pelos direitos de autor que cabem aos técnicos autores do projeto de arquitetura das fases desenvolvidas até ao estudo prévio e das subsequentes fases de anteprojeto e projeto de execução, compatibilizando os respetivos direitos/deveres de assistência técnica.
Ora, independentemente do que é afirmado na declaração emitida pelo arquiteto autor daquela alegada fase do projeto, alertou-se o Município de Valença, nos termos do n.º 2 do art.º 60.º do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos - Decreto-Lei n.º 63/85, de 14 de março -, para o conteúdo do direito de autor de carácter moral que é inalienável, irrenunciável e imprescritível, nos termos da lei.
Face às reservas acima apresentadas, o CDRN não pôde deixar de as comunicar à Entidade Adjudicante, para uma consciencialização das debilidades detetadas, que podem comprometer a legalidade do procedimento, e para uma reflexão sobre as medidas de melhoria a implementar neste ou noutros procedimentos futuros, disponibilizando os seus serviços para qualquer apoio ou esclarecimento que entendam necessário.
13/06/2023
Área da Encomenda
Conselho Diretivo Regional do Norte da Ordem dos Arquitectos
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