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VILA REAL E RÉGUA “ABRIRAM-SE” AO OLHAR DOS ARQUITECTOS
CELESTE PEREIRA

01.JUN.03
 

Duas cidades apontadas como maus exemplos urbanísticos
Visita guiada era dirigida à população, mas só profissionais se interessaram

A Ordem dos Arquitectos está empenhada em aproximar a arquitectura do grande público e fazê-lo perceber que a arquitectura é um factor condicionante e determinante do ambiente urbano. Ontem, integrado no ciclo de visitas a obras de interesse arquitectónico que tem realizado um pouco por todo o norte e centro do país, durante este que é o Ano Nacional da Arquitectura, a Ordem dos Arquitectos escolheu duas cidades, no mínimo, surpreendentes: Vila Real e Régua.
As duas urbes transmontanas são normalmente apontadas como exemplos de mau ambiente urbano. São cidades disformes e agressivas, onde os erros urbanísticos se acumulam. Mas o que muita gente não imagina - ou eventualmente isso passa despercebido no quotidiano das pessoas - é que no meio do caos urbanístico das duas cidades se escondem exemplos de arquitectura de referência no contexto nacional.
Ontem, em Vila Real, atentados urbanísticos como as torres do Miracorgo, erguidas na escarpa do rio Corgo, o edifício-rotunda que se situa em frente a este espaço, os "arranha-céus" da via-interior ao circuito automóvel, na zona das antigas "boxes", ou as gigantescas torres em construção na rotunda das Flores, junto ao nó do IP4, passaram despercebidos ao olhar dos visitantes. Despercebidos passaram também os maus exemplos de urbanismo existentes na cidade da Régua, entre os quais o mais emblemático: o gigantesco hotel implantado em cima da margem do rio Douro, em pleno leito de cheia.
Ignorando estes exemplos, a Ordem dos Arquitectos transportou os visitantes por um circuito de obras singulares onde a arquitectura é a marca preponderante. A escolha, como sublinhou a Ordem, foi "ecléctica". Não pretendeu privilegiar "olhar disciplinar sistematizado”, mas sim permitir a visita e exploração de lugares "mais escondidos do olhar do público e habitualmente inacessíveis".
A ideia era mostrar a um público não especializado o modo como a arquitectura "constrói" a cidade, mas este acabou por não responder ao convite. Ontem, à semelhança do que tem vindo a acontecer um pouco em todo o ciclo de visitas que a Ordem dos Arquitectos está a promover, só participaram no encontro os próprios arquitectos e profissionais relacionados com a área.
"É uma pena que esta mensagem não esteja a passar", lamentava a arquitecta portuense Fátima Fernandes, autora, juntamente com o marido, o italiano Michele Cannatà, de um dos projectos visitados ontem. A Ordem dos Arquitectos reconhece a lacuna e justifica-a com a falta de uma máquina interna que ajude a promover os encontros. "Este é um primeiro ensaio para algo que se pretende vir a instituir no futuro", sublinhava ontem um dos seus responsáveis.

Arquitecturas de cidade
Entre as obras de arquitectura que ontem se abriram ao olhar dos participantes no encontro promovido pela Ordem dos Arquitectos em Vila Real e na Régua, houve dois edifícios que merecem um destaque especial: o edifício feito para o Instituto de Navegabilidade do Douro (Albino Teixeira), na Régua, e o Centro de Acolhimento Temporário a Grandes Dependentes (Ricardo Santelmo). Não porque se destaquem das outras obras visitadas sob o ponto de vista da arquitectura, mas , simplesmente porque, como sublinhou António Belém Lima, o arquitecto responsável pela condução da visita, no "tempo em que o serviço público se dispersa por lugares de visibilidade e/ou acessibilidade duvidosas", dois equipamentos de uso social que contrariam essa tendência são necessariamente uma "referência urbana".
O circuito de ontem permitiu ainda conhecer dois projectos de habitação em Vila Real com orçamentos distintos - a cooperativa Habireal (António Belém Lima) e a Casa G (Michelle Cannatà e Fátima Fernandes), obras que se preocupam não só com o conforto interior, mas também com o confronto público/privado - e os novos escritórios dos Arquitectos do Pioledo (Carlos Santelmo), o principal grupo de arquitectos a trabalhar em Vila Real, autores da maioria das obras apresentadas ontem.


in jornal Público

 
 


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